segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

DOS PROFESSORES E DOS ESTALEIROS

1. Centenas de professores contratados manifestaram-se este sábado, no Porto (e três dias antes em Lisboa), em protesto contra a obrigatoriedade de realização de uma prova de ingresso na carreira docente, “inventada” por Nuno Crato, com o mero propósito de eliminar professores e candidatos a professores, numa rasteira lógica economicista, que não tem minimamente em consideração as pessoas envolvidas e põe em causa a credibilidade das instituições de ensino superior deste país.
Segundo é do domínio público, a prova é destinada aos professores não integrados na carreira docente, ou seja, aos contratados. Terá uma periodicidade anual e o seu alegado objectivo será "aumentar sustentadamente os padrões de qualidade do ensino", assim como a "equidade entre os candidatos ao exercício de funções docentes", de acordo com o Ministério da Educação e Ciência.
Obviamente que estamos no domínio da treta e da mais pura demagogia, mesmo para quem perspectiva esta matéria como observador. Os padrões de qualidade do ensino não aumentam apenas pela acção dos professores, como até Nuno Crato, o propagandista e actual utilizador do “eduquês”, sabe e deverá reconhecer. E se tal fosse verdade, teriam que ser todos os professores a submeter-se à famigerada prova. E não é o que vai acontecer, e muito bem. Não deveria é suceder com nenhum docente, porque a prova não faz qualquer sentido, é um perfeito absurdo e apenas dá a medida do desnorte e da prepotência que reina pelos lados da coligação de direita que nos coube em desdita. Ainda se fosse uma medida para o futuro e com regras universais, como acontece com o ingresso em carreiras como a medicina, a engenharia ou a advocacia, se admitiria. Assim, não!
Desde logo, não passa de um disparate obrigar a fazer a designada “prova de acesso à carreira” docentes que já estão a trabalhar, embora como contratados, há 10, 15 ou 20 anos, em muitos casos com avaliações de “bom” ou “muito bom”. Por isso, é "uma prova que não prova coisa nenhuma", como referem professores à comunicação social, e com toda a razão.
E deveria ser proibido ter professores naquelas condições tantos anos, quando o Estado obriga os privados a admitir os funcionários nos quadros a partir de um determinado número de anos de contratados. O Estado é um mau exemplo e um explorador, com todas as letras. Como deveria ser interdito alguém vir questionar a preparação ou as competências de um professor para a carreira, depois de leccionar anos e anos… Estamos no alegre reino do delírio!...
Falamos de professores que se formaram nas universidades creditadas pelo Estado para o efeito, com quatro ou cinco anos de estudos; que fizeram os seus estágios curriculares como mandam as regras; que se prepararam e cumpriram todas as etapas da sua formação pedagógica para exercerem cabalmente a sua actividade numa sala de aulas.
Por isso, o que está em causa, inequivocamente, é a falta de respeito do Governo pela situação dos professores que já leccionam há anos e que se permite dispor a seu bel-prazer da sua vida e destino. Chama-se a isso prepotência.
Como é também falta de reconhecimento da qualidade científica e pedagógica das universidades esta opção de Nuno Crato, que assim põe em causa de uma penada e com a maior desvergonha e pedantaria a credibilidade do ensino superior deste país, que ele quer asfixiar financeiramente.
Obviamente que, por detrás do folclore verbal do Ministro da Educação, está o propósito de afastar milhares de professores do sistema, com fins estatísticos. Para afirmar à Europa que o desemprego no professorado é residual.
Estamos a falar de uma sacanice de Nuno Crato aos professores, que pretende arrasar a vida e o futuro de mais de quatro dezenas de milhares de professores, numa prova de 120 minutos.
Outro aspecto a considerar é o do esbulho que o governo faz aos professores. Uma prova obrigatória e a pagar (20 euros) não passa de um infame saque aos concorrentes, por parte de um governo sem escrúpulos, que o que pretende é eliminar professores do sistema, obrigando-os a contribuir para o “ajustamento”, em mais de 1 milhão de euros (contando a prova geral e a específica, a 15 euros por cabeça, ao que se anuncia), sem a garantia de que venham a entrar na profissão. E tantos deles nem sequer estão a trabalhar…
O mesmo Crato que inferniza a vida aos docentes e desinveste claramente no ensino público, para o menorizar e descredibilizar, não se coíbe de acenar com os melhores apoios ao ensino privado.
Porque é disso que estamos a falar. Esta gente que nos governa nestes anos de chumbo quer acabar com tudo o que é público, para entregar os sectores fundamentais da educação, da saúde, da economia, aos privados.
Não estamos a falar de questões conjunturais, ditadas pela crise. Estamos a falar de uma estratégia ideológica que está a ser posta em prática pela direita ultraliberal para privatizar o melhor do país. Da energia aos correios.


2. É nessa lógica distorcida e algo satânica que se insere também a alienação dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo.
O secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, exigiu no fim-de-semana um inquérito à subconcessão dos Estaleiros ao grupo Martifer por suspeita de «favorecimento» ao sector privado com este negócio.
Na verdade, há coisas nebulosas no meio deste negócio, que deveriam exigir a intervenção e investigação das autoridades, para aumentar a sua transparência e clareza.
Não se entende o afã da privatização dos estaleiros e o despedimento de 609 trabalhadores. Como bem afirma o líder da CGTP, em 2012 o mesmo Governo «não teve» três milhões de euros para adquirir matéria-prima para começar a construir dois navios asfalteiros encomendados pela Venezuela, mas dispõe agora de 30,1 milhões de euros para despedir seis centenas de trabalhadores.
Como não se compreende que se passe a gestão daquela empresa para a Martifer, que tem um passivo maior, da ordem dos 370 milhões de euros, quando o dos ENVC rondará os 300 milhões de euros.
Sejam os governantes pelo menos sérios a defender o interesse público, o que, neste como em outros negócios, está muito longe de suceder.
E, como se sabe, à mulher de César não lhe basta parecer!...

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Antigos Alunos da Escola Industrial em magusto-convívio





A Associação dos Antigos Professores, Funcionários e Alunos da Escola Industrial e Comercial de Fafe (AAPAEIF), no âmbito do seu plano de actividades, promoveu mais um magusto-convívio, este sábado à noite, no polivalente da Escola Secundária de Fafe, no qual participaram mais de seis dezenas de associados e amigos.
Tive o prazer de lá ter estado, como convidado e sócio benemérito da Associação.

Foi uma noite de intensa convivência que contou com a alegria de antigos alunos (alguns vieram propositadamente do Porto ou de Matosinhos) daquele estabelecimento de ensino que existiu em Fafe entre 1959 e 1974 e que formou diversas gerações para prestar serviço no comércio e na indústria não apenas de Fafe mas do norte do país.

A confraternização foi abrilhantada pelo Rancho Folclórico de S. Vicente de Passos, que presenteou os convivas com diversos números do seu reportório, danças e cantares do Baixo Minho.

A presidente da direcção, Aurora Barros, usou da palavra para agradecera presença de todos e enquadrar esta actividade na vida da Associação, que anualmente assinala o aniversário da sua fundação, com um encontro dos antigos professores e alunos, que vai já na vigésima segunda edição. Este ano, o destaque foi para o lançamento do livro “À Descoberta dos Sonhos - Memória Viva” e de mais um número da revista “Labor et Virtus”.

A AAPAEIF é também habitualmente um dos parceiros das Jornadas Literárias que se realizam em Fafe desde 2010 e cujos participantes na edição deste ano foram agraciados neste convívio.
 
A confraternização serviu também para a primeira apresentação pública do grupo de cavaquinhos da colectividade, que evoluiu já em bom nível, com a participação de uma dezena de associados.
É seu ensaiador o jovem Miguel Pimenta.

sábado, 16 de novembro de 2013

Folhas de Outono

 
Cansadas dos dias
Desabam urgentes como um verso
Uma rosa uma lágrima
Que se desprende do olhar
 
Abandonam os ramos
À sua nudez
Enquanto os pássaros rumam
Ao sabor das buganvílias
Em bandos de sonora luz
 
O teu rosto escreverá
A pequenez dos dias
A demorada migração da alegria
E do calor dos corpos
 
Os gatos regressam ao anoitecer
Da casa para serem amados
Em meigas mãos de lã
 
Quase não há sol
Quando as folhas atapetam o chão
Dos teus lábios que soletram
As chuvas que desenham o horizonte
 
(Artur F. Coimbra. Poema publicado em 15 de Novembro no jornal Notícias de Fafe)

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

100 anos de Albert Camus


Passou hoje, 7 de Novembro, o centésimo aniversário do nascimento de um dos escritores mais marcantes do século XX, que foi Prémio Nobel da Literatura.
Refiro-me a Albert Camus, nascido na Argélia em 1913 e que morreu num acidente de viação em Janeiro de 1960, quando regressava a Paris com o seu editor.
Licenciado em Filosofia, dedicou-se depois ao jornalismo e à escrita.
Com a invasão da França pelos nazis, na Segunda Guerra Mundial, Camus travou relações com o filósofo existencialista Jean Paul Sartre, e engajou-se na Resistência francesa, escrevendo e depois tornando-se editor do jornal clandestino "Combat". Trabalhou depois no semanário L'Express.
O seu nome subira já nessa altura ao primeiro plano das letras francesas e mundiais.
As suas obras mais famosas são os romances O Estrangeiro, A Peste (uma alegoria da ocupação alemã e da condição humana e que foi traduzido para o português pelo escritor braseiro Graciliano Ramos) e A Queda.
Mas também se destacam os ensaios O Mito de Sísifo e"O Homem Revoltado; ou as peças de teatro Os Justos, Calígula ou o Equívoco.
Em 1957, recebeu a maior honraria literária em reconhecimento da sua obra: o Prémio Nobel da Literatura.
Morreria de acidente três anos depois, com apenas 47 anos.
Apesar de já ter desaparecido há mais de meio século, Albert Camus “é um daqueles escritores que são intemporais pela sua genialidade e actualidade da escrita” (António Souza Pinto, Livros do Brasil).
Por isso ainda é um autor procurado e lido pelos leitores portugueses.
Até porque os temas que explora na sua obra, sobretudo a ideia do absurdo da existência humana, além de terem contribuído fortemente para o enriquecimento da filosofia, são temas de todos os tempos e lugares.
Porventura a sua obra mais famosa é O Estrangeiro. Lançada em 1942, foi traduzida em mais de quarenta línguas e recebeu uma adaptação cinematográfica realizada por Luchino Visconti em 1967.
Faz parte do "ciclo do absurdo" de Camus, trilogia composta por esse romance, pelo ensaio O mito de Sísifo e pela de teatro Calígula que descrevem o aspecto fundamental da sua filosofia : o absurdo.
O Estrangeiro é uma obra que marca a literatura do séc. XX e o pensamento de quem a lê. Decide-se aqui o destino de um homem que matou outro. Por causa do sol. Não há perdão nem arrependimento, só o absurdo!
Um autor a descobrir, por quem não o conhece.
 
É absolutamente intemporal e actual, como acima se refere!...

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

O “GUIÃO” DE PAULO PORTAS NÃO PASSA DE MANOBRA DE DIVERSÃO



O chamado “guião para a reforma do Estado”, apresentado há dois dias e que Paulo Portas levou 333 dias a parir, não passa de um nado-morto. RIP!
Porque os partidos responsáveis (o PS e o próprio PSD), mais o bom senso político de quem tem alguma réstia de lucidez, vão mandar o inútil desperdício de tempo e de paciência para onde merece: o caixote do lixo!
À média de 1/3 de página por dia, para as 110 “páginas úteis”, dir-se-ia que o “guião” é de uma pobreza franciscana e que não passa de uma colecção de lugares comuns, um chorrilho de banalidades.
Um documento que apenas é feito para justificar os cortes brutais que já foram feitos nos Orçamentos de Estado de 2012, 2013 e no de 2014. Curiosamente, pelo “mero acaso” das legislativas, promete-se aliviar o calvário do sofrimento em 2015… O ano do adeus!...
Um documento perfeitamente inútil e que não passa de uma manobra de diversão para distrair os incautos do bárbaro Orçamento de Estado que foi hoje aprovado no Parlamento apenas pelos seus autores: não vai conseguir sai do papel.
Um documento que não tem em conta o artigo 9º da Constituição, em diversos aspectos, e por isso é inconstitucional, como tem sido timbre de tantas medidas deste governo em permanente situação de fora de lei.
Por isso é extemporâneo. Já deveria ter sido apresentado há pelo menos dois anos, de é que pretendia algum pingo de oportunidade.
Pelas ideias que banaliza, mais parece o programa do CDS para as legislativas de 2015. Não colhe.
Portas diz querer mudar o Estado em seis anos: mas se está a um ano das eleições e se a discussão vai ainda começar com os partidos e os parceiros sociais (os cidadãos que se lixem, eles que depois mandam lixar quem os manda…), Portas quer o quê? Mandar quando já não estiver no governo?
Porque, curiosamente, nem o PSD legitima as ditas “reformas”, que mais não são do que cortes (não “melhorias”) ferozes em tudo o que é Estado Social e sector público da actividade.
Pretende Portas “modernizar” o Estado: mas há alguém que defenda um Estado antigo?
Pretende Portas “renovar” o Estado: mas há alguém que queira um Estado parado no tempo?
Tenha dó da inteligência alheia…
Proclama bagatelas e trivialidades, como grandes reformas. É só cortes, restruturações, fusões, centralizações.
Uma das primeiras “sugestões” é “diminuir o recurso a serviços externos ao Estado, começando pelas funções jurídica e contenciosa”, o chamado recurso sistemático ao “outsourcing”. Mas isso não é reforma nenhuma, é acabar com um escândalo que custa milhões aos contribuintes e que este governo nestes dois anos e meio não se tem cansado de aplicar. Onde está a coragem de acabar com os pareceres pagos principescamente aos escritórios de advogados dos amigos?
O documento não passa de um chorrilho de intenções, que não são para concretizar, de manobras de diversão, de condenação ao cesto dos papéis da história.
No ensino e na saúde, a agenda é a mera e estimulada privatização dos serviços, para engordar os privados. Mas onde se esperava outra coisa, vinda de quem vem?
Na cultura, por exemplo, mais vulgaridades: “melhor acesso à cultura, com o Estado a responder à procura com mais informação, mais parcerias e mais descentralização”. Ou seja, o Estado marimba-se para a cultura. Demite-se da sua missão central e constitucional. Passa a bola para os parceiros e informa os cidadãos. Mas para que raio serve um Estado assim?
Mais um exemplo: a colocação de desempregados. O documento prevê “desafiar a iniciativa privada a ajudar a melhor a colocação de desempregados” Importa-se de repetir? Mas os privados precisam do Estado para lhes ensinar quem devem meter nas suas empresas?
Finalmente, para não ir mais longe: a desburocratização. Sonha o Portas na “massificação do uso dos serviços públicos electrónicos, através da aposta permanente em interfaces simples, intuitivos e seguros”. Mas não saberá sua excelência que tanto aprecia as feiras que, numa população envelhecida, há milhões de portugueses info-excluídos? Até onde vai a fantasia de Paulo Portas?
No DN desta quinta-feira, 31 de Outubro, há um texto imperdível sobre este assunto de André Macedo, director do Dinheiro Vivo.
Chama os bois pelos nomes. Fala de um texto que é “uma loja dos 300”!, de uma “pobreza inacreditável”, uma “salgalhada ignorante, colecção de chavões e banalidades”, feito por “este grupo de estagiários que o país tragicamente elegeu”…
E tantos outros. Vão à net e leiam!
 

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Ilse Losa (1913-2006): um mundo vivido sob céus estranhos





Ilse Losa é nome de uma enorme e inolvidável escritora nascida na Alemanha em Março de 1913, fez agora 100 anos e que, por ser judia, se refugiou em Portugal, com apenas 21 anos, nos anos de brasa do nazismo.
Nos anos 80 e 90 tive a honra de por várias vezes privar com ela e de ter diversas obras suas autografadas.
Cheguei a publicar uma entrevista exclusiva com Ilse Losa no diário Correio do Minho de 26 de Junho de 1988, há 25 anos, que é um enorme testemunho humano.
Marcou uma geração de jovens, nas últimas décadas do século XX, sobretudo, pelas suas sugestivas obras para o público infanto-juvenil, mas está hoje muito esquecida. Apesar de ser autora também de obras fantásticas de ficção (para o público em geral) como “O Mundo em que Vivi”, “Rio sem Ponte” ou “Sob Céus Estranhos”.
A Biblioteca Nacional tem presentemente patente (e até 16 de Novembro) uma mostra sobre a vida e obra da conhecida escritora.

Durante o ano de 1930, em Inglaterra, teve os primeiros contactos com escolas infantis e com os problemas das crianças. Sendo judia, foi forçada a sair definitivamente da Alemanha em 1934, refugiando-se em Portugal, onde casou com o arquitecto Arménio Losa, adquirindo a nacionalidade portuguesa.
 
A sua vastíssima obra inclui romances, contos, crónicas, trabalhos pedagógicos e literatura para crianças. Colaborou em diversos jornais e revistas, alemães e portugueses. Está representada em várias antologias de autores portugueses e colaborou na organização de selectas e na tradução de obras portuguesas publicadas na Alemanha. Verteu do alemão algumas obras dos mais consagrados autores, nomeadamente o conhecido Diário de Anne Frank.

Em 1984 recebeu o Grande Prémio Gulbenkian, premiando o conjunto da sua obra para crianças. Em 1990 foi editado na Alemanha o seu romance O mundo em que vivi, o mesmo acontecendo em 1992 com o livro de contos Caminhos sem destino.

Para além das obras já citadas, publicou, entre outras: À flor do tempo; Encontro no Outono; Grades brancas e Retta. Na literatura para crianças destacamos: Miguel, o expositor; A Visita ao padrinho e outras histórias; Silka; O Senhor Pechincha seguido de O Bonifácio; A adivinha: peça em quatro quadros; O Príncipe Nabo; O quadro roubado; Na quinta das cerejeiras; O fidalgo das pernas curtas; Beatriz e o plátano e Faísca conta a sua história.

Morreria no Porto em 6 de Janeiro de 2006, com a vetusta idade de 93 anos.
É uma autora mais portuguesa que alemã (viveu no Porto 72 dos seus 93 anos…) que não deve ser esquecida.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

JOÃO GONÇALVES APRESENTOU O SEU LIVRO DE ESTREIA POÉTICA “MOMENTOS DO OLHAR”







 
 
Na noite de sexta-feira, 18 de Outubro, teve lugar na Sala Manoel de Oliveira, em Fafe, a apresentação da obra “Momentos do Olhar”, estreia poética de João Gonçalves.
Estiveram presentes dezenas de amigos e familiares do poeta, funcionário municipal e dirigente do Desportivo Ases de S. Jorge.
A sessão contou com a participação musical dos jovens Diana e Duarte Baptista e a leitura de poemas por Acácio Almeida.
Na mesa, além do autor, que fez os habituais agradecimentos e enquadrou o historial da obra, usaram da palavra o editor João Artur Pinto e o vereador da Cultura, Pompeu Martins.
O responsável da Labirinto realçou o facto de “Momentos do Olhar” ter a intervenção de quatro funcionários públicos (o poeta, o autor da capa, Manuel Meira, a autora do desenho da capa, Sandra Novais, e o prefaciador da obra, Artur Coimbra), o que não deixa de ser significativo, numa altura em que tanto se desvaloriza o seu trabalho, destacando ainda o facto de a obra ser apoiada pelo Centro de Cultura e Desporto dos Trabalhadores do Município, como exemplo de boas práticas de funcionários na área da criação cultural.
Já Pompeu Martins começou por ler uma mensagem do presidente da Câmara, José Ribeiro, ausente do concelho, que louvou a coragem de João Gonçalves em mostrar o seu trabalho literário e aproveitou para dar os parabéns ao autor, como “colega” das letras e como vereador do município. Recordou diversos episódios do percurso comum, em especial uma iniciativa em finais dos anos 90 que trouxe a Fafe o Prémio Nobel da Paz Ramos Horta.
A obra “Momentos do Olhar” foi apresentada e analisada circunstanciadamente pelo escritor e historiador Artur Coimbra que considerou uma “agradável surpresa estes Momentos do Olhar, um título sugestivo que remete desde logo para a pluralidade dos modos de recolher e investir em cada instante de que se cria o poema. Cada poema nasce do seu momento, reflecte inevitavelmente o olhar interior ou exterior do poeta, as suas emoções, os seus registos oníricos, as suas vivências”.
Artur Coimbra considerou que uma primeira obra, naturalmente, tem os seus pontos mais fortes e as suas fragilidades mas que, neste caso, os primeiros superam as segundas, e, quando assim é, “vale a pena seguir em frente e desfrutar de quanto de luminoso e inesperado se colhe nas páginas do livro”.
O autor do prefácio considera que a maior parte da obra é “um longo poema de amor, em diferentes momentos”, de que deu alguns exemplos. 
Uma obra onde o sonho também é político: de Timor “esquecido”, em determinada altura, à aspiração dos que lutaram pela liberdade, contra a ditadura.
 Uma obra onde o poeta escolhe o lado dos mais fracos, dos desfavorecidos, dos deserdados da vida, dos velhinhos, dos sem-abrigo.
Os poemas da obra são, em geral, sintéticos, enxutos, de uma linguagem que investe num arrojo literário já assinalável para quem começa. Em imagens e figuras de estilo de que deixou alguns exemplos,
Recomendando a leitura da obra, pela “sua inegável qualidade literária”, deixou  felicitações muito amigas ao João Gonçalves, desejando que “esta seja a primeira de outras obras, porque seguramente tem potencial para novas incursões na área da poesia, valorizando a cultura e os valores do nosso município!”.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Apresentação de "Momentos do Olhar", de João Gonçalves








 
Na noite de sexta-feira, 18 de Outubro, teve lugar na Sala Manoel de Oliveira, em Fafe, a apresentação da obra “Momentos do Olhar”, estreia poética de João Gonçalves.
Tive o privilégio de redigir o prefácio e apresentar a obra, perante dezenas de amigos e familiares do poeta.
Deixo de seguida, o essencial das palavras que proferi na sessão, que contou com a presença do vereador da cultura e poeta, Pompeu Martins e do responsável maior da editora Labirinto, João Artur Pinto, que também felicitaram o autor.
A sessão contou com a participação musical de Diana a Duarte Baptista e leitura de poemas por Acácio Almeida.
“É-me especialmente grato deixar aqui algumas palavras em torno deste livro.
Por ser seu amigo e colega de trabalho há longos anos, mas sobretudo pela agradável surpresa que resulta destes Momentos do Olhar, um título sugestivo que remete desde logo para a pluralidade dos modos de recolher e investir em cada instante de que se cria o poema.
Cada poema nasce do seu momento, reflecte inevitavelmente o olhar interior ou exterior do poeta, as suas emoções, os seus registos oníricos, as suas vivências.
Uma primeira obra, naturalmente, tem os seus pontos mais fortes e as suas fragilidades. Felizmente, os primeiros superam as segundas, e, quando assim é, vale a pena seguir em frente e desfrutar de quanto de luminoso e inesperado se colhe nas páginas do livro.
O poeta é um ser sensível que experimenta a radicalidade das emoções, o esplendor dos sonhos, a aventura do amor. Os corpos quentes da noite, o encontro dos sentidos, a fúria dos instintos. A mistura poética e escultural, de um corpo que é vida e que é arte. A deusa que o poeta ardentemente aspira, para adoração, como fonte de água cristalina e fogo que acendeu o rastilho do desejo. Mas também a sua ausência, a precariedade e a carência do ser amado.
 
Porque amar-te não é pecado
E o amor não tem dono (Ausências, p. 25)
 
Poemas de amor há inúmeros, talvez a maior parte do livro seja um longo poema de amor, em diferentes momentos. Mais ou menos sensuais e até atrevidos.
Como este pequeno texto (p. 14):
 
A fera, ferida,
Felina, de garras afiadas
Olhos, penetrantes
Boca húmida,
Corpo Sinuoso
Curvas traiçoeiras
Lâmina brilhante
De quadril cativante.
 
Ou no poema Memórias (p.26), de que leio um excerto:
 
E nas minhas memórias
Recruto a imagem do teu corpo
Filho de um amor que não é o meu
Maior dos meus encantos
 
E em cada curva do teu corpo
Eu quero estar presente
Quero abraçar-te e sentir
O teu calor ardente
 
Os teus lábios tocando nos meus
Os teus olhos a reluzirem
Meu amor é só teu
Não o deixes partir.
 
Há diversos outros exemplos, mas terão de ser os leitores a enumerá-los.
Uma obra onde o sonho também é político: de Timor “esquecido” (p. 18), em determinada altura, à aspiração dos que lutaram pela liberdade, contra a ditadura, por um país azul! (p. 19):
 
Azul, o sonho
 
Tinham o sonho
O sonho que um dia seria possível viver em liberdade
E foram acreditando
 
Tinham um sonho
O sonho que era possível viver em democracia
Era a esperança
 
Tinham o sonho
O sonho que um dia poderiam regressar do exílio
A Saudade
 
Tinham o sonho
O sonho que um dia cairia a ditadura
Era a vontade
 
Tinham o sonho
O sonho que Portugal seria um país azul
Sim azul!... Como o céu!
 
Uma obra onde o poeta escolhe o lado dos mais fracos, dos desfavorecidos, dos deserdados da vida, dos velhinhos, dos sem-abrigo (p.22):
 
Vítima
 
És vítima do sistema
Que não quer sequer sentir
Que ainda procuras esquina
Para poderes dormir
 
Estendes na pedra fria
Um simples cartão
Que usas todos os dias
Como fosse o teu colchão
 
Serves-te do manto achado
Para poderes pernoitar
E diminuíres o frio
De um sono ao luar
 
Mas também ao menino órfão, que abre sorrisos e arranca lágrimas, ou à “criança sem ninguém e abandonada” (p. 50).
Igualmente há lugar para belas homenagens poéticas ao pai e à mãe, como pilares fundacionais da sua existência.
 
Os poemas são, em geral, sintéticos, enxutos, de uma linguagem tecida no bragal do quotidiano, mas investindo num arrojo literário já assinalável para quem começa. Em imagens e figuras de estilo de que se podem deixar aqui alguns exemplos, extraídos de poemas diferentes:
 
O calor da beleza
Pulsa em minhas mãos…
(…)
sedento, mas forte
Embriago-me nos beijos… (p. 13)
 
Tocar os lábios de mel… (poema Desejos, p. 31)
 
No poema Na madrugada:
 
Apaga-se a lua
Acende-se o fogo do meu coração
 
(…)
Invento caminhos para te ver passar
Talvez um vício, um pecado
Que teme a estrada da madrugada
Onde passo nos mais tímidos dos silêncios.
 
Ou no poema Comparando (p. 51):
 
O cabelo como uma floresta
Os olhos como o Sol ou a Lua
Nas veias oceanos e rios…
A poesia é exactanente tudo aquilo que, pela palavra e pela emoção, comove,sensibiliza e desperta sentimentos.Estas características estão, inteiras, nas páginas desta obra, cuja leitura não posso deixar de recomendar.
Deixo aqui dois poemas breves que marcaram a minha leitura e gostaria de partilhar convosco:
 
Noite (p. 17)
 
Pelas ruas
No frio e no silêncio
De mãos gélidas
Nada encontro
Simplesmente a noite
Mergulhada nos seus silêncios
Murmurando o eco de um nome
Escondido nos seus segredos.
 
Espírito de alma (p. 57)
 
A alma flui…
No horizonte o sol
A onda do mar
Um olhar um adeus
Lágrima que teima
Aconchego ternura
Suspirando, bebendo
Minha pele na tua,
Teus olhos nas estrelas…
Teu toque nas pétalas
No murmúrio das ondas
O sopro da brisa
Teus lábios nos meus
 
Poemas de inegável qualidade literária, tal como a generalidade dos que integram esta obra.
Resta-me deixar felicitações muito amigas ao João Gonçalves, que seguramente tem potencial para novas incursões na área da poesia, valorizando a cultura e os valores do nosso município!”.